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01/06/2021

Pesquisador do INI participa de webinar sobre situação da esporotricose humana no Brasil


Antonio Fuchs

Dayvison F. Saraiva Freitas, pesquisador do Laboratório de Pesquisa Clínica em Dermatologia Infecciosa do INI, participou, no dia 26 de maio, do Webinar Esporotricose - uma epidemia sem controle? promovido pelo Ministério da Saúde. O médico dermatologista abordou a epidemiologia, o diagnóstico e os aspectos clínicos da doença. O debate contou com as participações de Flavio de Queiroz Telles Filho, da Universidade Federal do Paraná, e Zênia Monteiro Guedes dos Santos, da Coordenação-Geral de Vigilância das Doenças de Transmissão Respiratória de Condições Crônicas do Ministério da Saúde.

“Será que vamos ter um controle da esporotricose? Eu espero que sim, mas isso envolve uma série de fatores como um melhor conhecimento da doença, mais capacidade de diagnóstico e tratamento, além da educação da sociedade. Sabemos que ela não será erradicada, mas é possível sim um melhor manejo da doença, que é um sério problema de saúde pública”, falou Dayvison ao iniciar sua exposição.

O médico informou que a esporotricose é a micose subcutânea mais frequente no Brasil e que está em expansão pela América Latina como um todo, lembrando que as micoses são causadas por fungos que estão na natureza e que o Sporothrix, já descrito há mais de 120 anos, está no meio ambiente, seja em um lixão, um terreno baldio ou em plantas que crescem nesses locais. O pesquisador citou ainda algumas grandes epidemias da doença que ocorreram como em 1940, em minas de ouro na África do Sul, nos anos de 1980, em mudas de pinheiros natalinos nos Estados Unidos, e no final dos anos de 1990 e início dos anos 2000 nos fenos utilizados como enfeites de festas de Halloween, também nos Estados Unidos e na Austrália.

Esporotricose no Rio de Janeiro

“Há uma hiperendemia de esporotricose no Rio de Janeiro. Entre 1991 e 2015 foram 7.897 casos de pacientes humanos com esporotricose diagnosticados no INI e no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). De 2016 em diante sabemos que a média anual está em torno de 1.200 a 1.400 casos. Desde 2013 a doença passou a ser de notificação compulsória em todo o estado do Rio de Janeiro. Desta forma é possível termos uma visibilidade maior da esporotricose e os gestores podem traçar medidas de controle e ações mais efetivas para o seu enfrentamento”, afirmou Dayvison.

O perfil epidemiológico da doença no Rio de Janeiro é de mulheres entre 30 e 50 anos, com atividades no peridomicílio (donas de casa, estudantes, aposentadas), residentes em áreas metropolitanas com baixa infraestrutura de saneamento e contato direto com gatos. “Mais de 90% dos casos que levantei para a minha dissertação de mestrado em Pesquisa Clínica em Doenças Infecciosas [Dez anos de epidemia de esporotricose no estado do Rio de Janeiro: estudo clínico-epidemiológico e terapêutico dos casos atendidos no Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas entre 2005-2008] tinham esse contato direto com o animal, e mais de 2/3 possuíam um trauma envolvido o início da doença, seja arranhadura, mordedura ou os dois ao mesmo tempo”, salientou.

Dayvison também citou o destino inadequado dado aos gatos doentes conforme dados obtidos durante seu estudo. Dos 734 animais envolvidos na cadeia de transmissão da doença, 29% tiveram um tratamento adequado com isolamento dentro das residências, ou foram cremados no caso de óbito, enquanto 71% dos gatos foram dados como desaparecidos, abandonados ou doados. Aqueles que morreram foram jogados fora ou enterrados de forma errada, perpetuando assim uma cadeia de transmissão que já se estende por todo o Brasil e por países vizinhos.

Etiologia e diagnóstico da doença

Existem mais de 50 espécies dentro do gênero Sporothrix, sendo que sete delas causam a doença: S. schenckii, S. brasiliensis, S. globosa, S. mexicana, S. luriei, S. pallida e S. chilensis. O Sporothrix brasiliensis está envolvida na transmissão zoonótica (de um animal para os seres humanos) e tem a peculiaridade de ser a mais virulenta. Para a comprovação da doença é necessário um exame micológico direto com cultura para fungos. “Precisamos da cultura para termos o diagnóstico de certeza. As unidades básicas de saúde não possuem laboratórios de micologia. O ideal é fazer o isolamento do fungo em cultura. O exame direto raramente é positivo no caso de seres humanos, mas métodos auxiliares como sorologia e histopatologia podem auxiliar nesse processo”, explicou Dayvison.

O pesquisador apresentou ainda as diferentes formas da doença em humanos, ressaltando que a linfocutânea é a mais comum, chegando a quase 70% dos casos, sendo caracterizada por um nódulo ulcerado que ocorre geralmente no local da inoculação, ou seja, onde houve a mordedura ou o arranhão por parte do animal, seguida de lesões semelhantes ao longo do trajeto dos vasos linfáticos. Já a forma fixa da doença representa 25% dos casos, com lesão cutânea única. Por fim, Dayvison citou ainda as formas disseminadas e pouco frequentes para a esporotricose que acontecem normalmente quando o hospedeiro tem alguma imunossupressão, principalmente infeção por HIV, etilismo ou diabetes, por exemplo. Na transmissão zoonótica, os múltiplos arranhões e mordidas também podem levar a apresentações clínicas de lesões cutâneas disseminadas, mesmo em quem tem a imunidade preservada.

Manejo e tratamento da doença

O pesquisador da Universidade Federal do Paraná, Flavio de Queiroz Telles Filho, falou sobre o manejo precoce e otimizado da esporotricose humana, destacando que o diagnóstico preciso da doença é fundamental para um melhor tratamento a fim de se evitar suas formas mais graves. Além apresentar alguns casos clínicos e falar da necessidade de um diagnóstico rápido da esporotricose em pacientes imunodeprimidos, como aqueles com diabetes, aplasia medular ou HIV, o pesquisador informou que o Grupo Técnico de Micoses Sistêmicas do Ministério da Saúde está elaborando um protocolo de manejo da esporotricose humana trazendo os diferentes tipos de medicamentos que podem ser adotados para o tratamento da doença, como o itraconazol, a terbinafina, a solução saturada de iodeto de potássio, o posaconazol e a anfontericina B.

Encerrando as palestras, Zênia Guedes, da Coordenação-Geral de Vigilância das Doenças de Transmissão Respiratória de Condições Crônicas do Ministério da Saúde, informou que os estados do Rio e Janeiro, Pernambuco, Paraíba e Minas Gerais já fazem a notificação compulsória da esporotricose humana e que o site do Ministério da Saúde possui uma página específica para a doença, trazendo os sintomas, causas, prevenção, diagnóstico e tratamento. “Segundo dados do Ministério, de 2007 a 2018, foram 44.795 casos de pessoas internadas por micoses sistêmicas em todo o país, sendo 672 por esporotricose, com maior concentração de internações na região sudeste”, destacou.

Zenia apresentou ainda alguns avanços no campo das micoses sistêmicas, como o início do processo de inclusão da criptococose, da esporotricose humana e da paracoccidioidomicose na lista das Doenças de Notificação Compulsória, a perspectiva de implementação de um sistema de informação na notificação e no tratamento das pessoas com micoses endêmicas e a incorporação de novas tecnologias terapêuticas como o cloridrato de terbinafina. “Temos também o desafios de implantar e implementar a vigilância da esporotricose em todo território nacional, fortalecer a rede de laboratórios com disponibilidade de insumos diagnósticos e ampliar a capacitação dos profissionais de saúde da assistência, vigilância e laboratorial para melhor conhecerem a doença”, concluiu.

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