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10/11/2020

Políticas públicas para pessoas vivendo com HTLV


Texto: Antonio Fuchs / Edição: Juana Portugal

Ionara Ferreira da Silva Garcia, assistente social do INI/Fiocruz, desenvolveu uma pesquisa pioneira que apresenta uma análise da inclusão dos portadores do vírus T-linfotrópico humano (HTLV) em agendas governamentais, de forma a contribuir para o debate e ampliar a visibilidade da doença em sua tese de doutorado em Saúde Pública. Orientada pela pesquisadora Élida Azevedo Hennington, Ionara desenvolveu a pesquisa estudo com o título Políticas públicas para pessoas vivendo com HTLV: análise da agenda governamental foi defendido na Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz) em julho.

A assistente social ressaltou que o Brasil é o país como o maior número absoluto de indivíduos infectados e portadores assintomáticos da doença, com estimativa de prevalência de até 2,5 milhões de soropositivos. Ionara revelou que as experiências encontradas mostram que as iniciativas existentes no país ainda são poucas e, muitas vezes, isoladas, para prevenção e controle da infecção pelo HTLV, e afirmou: “tendo em vista insuficiente e frágil divulgação sobre o HTLV e ainda restritas experiências de prevenção e controle desta Infecção Sexualmente Transmissível (IST), a possibilidade de crescimento no número de novos casos é uma realidade”.

De forma a delimitar o estudo, uma vez que buscava-se ampliar o conhecimento acerca da temática do HTLV e as conquistas de direito dos portadores da doença, a autora definiu como objeto de análise os estados da Bahia e Minas Gerais. “Nesta pesquisa buscamos conhecer e analisar o processo de formulação de agenda e a implementação de políticas e ações referentes ao HTLV nesses dois estados, pois são precursores no desenvolvimento de políticas públicas voltadas para pessoas infectadas pelo vírus”, explicou Ionara.

Em sua tese, a autora utilizou o modelo Múltiplos Fluxos, desenvolvido por John Kingdon para explicar o por que as questões se transformam em problemas políticos, de forma a compreender como e de que forma esta temática foi inserida na agenda governamental brasileira. Bahia foi um dos estados selecionados para o estudo por ser umas das unidades federativas com maior prevalência de HTLV identificado no Brasil e onde são desenvolvidas ações amplas e integradas para controle do vírus, diagnóstico e tratamento de infectados. Outro estado que fez parte do estudo foi Minas Gerais por este ser o primeiro onde foi regulamentada a política de diagnóstico, prevenção e controle do vírus na população em geral e onde também está sediado o Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em HTLV/Hemominas, um influente e reconhecido grupo de cientistas que tem produzido significativo material sobre a temática.

“Durante as análises, constatamos diferentes fatores que contribuíram para inclusão do tema nesta agenda. Na Bahia, por exemplo, a magnitude e a gravidade de casos, agregadas à mobilização da comunidade científica, contribuíram para o desenvolvimento de pesquisas, além de conjuntura política favorável com gestores e parlamentares sensíveis à situação e atuante militância de indivíduos infectados”, disse.

“No estado de Minas Gerais observamos que as decisões aprovadas para os portadores da doença favoreceram a ampliação de ações referentes ao HTLV, porém, apesar de defesa de pesquisadores quanto à necessidade de estruturação da assistência e investimentos na área, não houve consenso em todo momento para maiores avanços. As dificuldades de implementação de uma política setorial e a inexistência de grupos de pressão organizados colaboraram para que essas ações não fossem uma prioridade para as secretarias de saúde de Minas Gerais”, salientou a pesquisadora.

Ionara observou que na conjuntura atual, indivíduos infectados por HTLV e outros atores envolvidos com o tema ainda possuem um longo caminho a percorrer na mobilização para investimentos na área, para a formulação e implementação de políticas públicas e conquista de direitos sociais. “As políticas aprovadas não necessariamente repercutiram em ações concretas. No entanto, tais aprovações se constituem em ponto de partida para reivindicação do cumprimento das mesmas e, consequentemente, da luta para a ampliação de direitos da população afetada”, destacou.

Por fim, a autora considera fundamental o levantamento da prevalência da infecção na população geral para o planejamento de ações mais concretas. “Nesse contexto insere-se a inclusão do HTLV na Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública. Seria pertinente também a testagem para o vírus nos exames de rotina de pessoas com diagnóstico de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), além da inclusão da testagem no pré-natal”, concluiu.

Conheça o HTLV

O Brasil é uma área endêmica para o HTLV, sendo considerado o país com maior número absoluto de casos. O vírus tipo 1 está presente em todo o território nacional de forma heterogênea, com prevalências variando de 800.000, segundo dados de 2012, podendo chegar a 2,5 milhões de pessoas infectadas. Uma pesquisa publicada em 2005 analisou amostras dos hemocentros das capitais de todos estados do Brasil nos períodos de 1995 a 2000 e mostrou que as maiores prevalências de HTLV se encontram na região Norte e Nordeste, com 10/1000 em São Luís (MA) comparados com 0,4/1000 em Florianópolis (SC). Outros estados da região nordeste também se destacaram como Bahia (9,4/1000 pessoas infectadas), Pará (9,1/1000 pessoas infectadas) e Pernambuco (7,5/1000 pessoas infectadas). Já o vírus tipo 2 também está presente no Brasil, porém de forma diferenciada e mais frequentemente nas populações indígenas, sinalizando a Amazônia brasileira como a área com maior ocorrência de HTLV 2 no mundo.

A infecção causada pelo vírus T-linfotrópico humano (HTLV), cuja sigla em inglês é Human T cell Lymphotropic Virus, atinge as células de defesa do organismo, os linfócitos T. O HTLV foi o primeiro retrovírus humano isolado (no início da década de 1980) e é classificado em dois grupos: HTLV-I e HTLV-II.

A transmissão do HTLV ocorre por via sexual em relações desprotegias (sem camisinha), pelo compartilhamento de seringas e agulhas, e da mãe para o recém-nascido (transmissão vertical), principalmente pelo aleitamento materno.

A maioria das pessoas infectadas pelo HTLV não apresentam sinais e sintomas durante toda a vida. O tratamento é direcionado de acordo com a doença relacionada ao HTLV. Dos infectados pelo HTLV, 10% apresentarão algumas doenças associadas a esse vírus, entre as quais se podem citar: doenças neurológicas, oftalmológicas, dermatológicas, urológicas e hematológicas (ex.: leucemia/linfoma associada ao HTLV).

Saiba mais sobre a doença aqui.

Sobre a autora

Ionara Ferreira da Silva Garcia possui graduação em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestrado em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca e doutorado em Saúde Pública pela mesma instituição. É tecnologista em Saúde Publica da Fundação Oswaldo Cruz, atuando como assistente social do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz). Integra a equipe de estudos sobre Cuidados Paliativos do INI/Fiocruz e do Projeto Trajetórias de pessoas afetadas pelo HTLV: acesso e cuidado de usuários do INI. Tem experiência como assistente social, sanitarista na área de Saúde Pública, vigilância sanitária e saúde da família. 

* Com informações do Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das IST, do HIV/Aids e das Hepatites Virais

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