Texto: Antonio Fuchs e Juana Portugal / Revisão: Juana Portugal
A histoplasmose é uma infecção causada pela inalação de esporos do fungo Histoplasma capsulatum, comumente encontrado em fezes de pássaros e morcegos. Atualmente existem apenas dois medicamentos para o tratamento da doença. Pesquisadores do Laboratório de Micologia do INI iniciaram um estudo para analisar a utilização de fármacos já existentes no mercado para combater a infecção. Foi este o tema da apresentação do chefe do laboratório, Rodrigo de Almeida Paes, no Simpósio de Aniversário do Instituto, no dia 08 de novembro.
“É possível encontrar o Histoplasma capsulatum também em galinheiros desativados, ocos de árvores, construções abandonadas ou cavernas. Um indivíduo se contamina quando entra em contato com esses habitats, respira os micropolídeos do fungo e estes, nos alvéolos pulmonares, se convertem para a forma de levedura, causando assim a infecção”, explicou Rodrigo.
A doença é cosmopolita e considerada endêmica ou potencialmente endêmica em 93 países do mundo. Com o aumento dos casos de HIV sua frequência vem crescendo também e no Brasil há diversos relatos de casos de coinfecção de histoplasmose/HIV nas regiões Norte e Sudeste. “Fizemos um trabalho pelo Laboratório de Micologia destacando a histoplasmose em nosso país e, por não ser uma doença de notificação compulsória, não temos dados exatos sobre ela. Fomos então atrás de publicações que traziam relatos de casos e os estados mais afetados são o Ceará, o Rio de Janeiro, Goiás e Rio Grande do Sul, locais onde existe uma tradição em micologia médica. No Amapá, por exemplo, não encontramos nenhuma publicação e acreditamos que isso é impossível porque o estado faz fronteira com a Guiana Francesa onde a histoplasmose é bastante ativa”, destacou.
As chances de uma pessoa desenvolver os sintomas de histoplasmose é maior conforme o aumento do número de esporos que são inaladas por ela e não são todos que desenvolvem a doença. Isso também varia de acordo com a cepa existente no ambiente infectado. O indivíduo afetado pode ter, como sintomas, febre, tosse seca, dores no peito ou nas juntas e inchaço vermelho nas pernas.
Apenas duas drogas são usadas hoje em dia para o tratamento da histoplasmose: a anfotericina B e o itraconazol, limitando muito as opções médicas. Um ponto alertado pelo pesquisador é o diagnóstico tardio da doença. “A maioria dos pacientes descobre a histoplasmose já está num estágio avançado e com a limitação de medicamentos não há muito o que se fazer. Eles acabam vindo a óbito muitas vezes antes de receberem o diagnóstico tradicional, que é feito através de cultura e que demora de três a quatro semanas para ficar pronto”, disse. O tempo de tratamento é longo. Geralmente os pacientes precisam tomar a medicação durante um ano, pelo menos, dependendo da gravidade do caso.
Novas opções de tratamento
Rodrigo acredita que o ideal para o tratamento seria o desenvolvimento de novos fármacos, mas fazer isto do zero demandaria muito custo para uma indústria que pensa pouco nas doenças negligenciadas. “Tivemos a descoberta de novos antifúngicos em estudos pré-clínicos ou de fase 1, mas o grande problema é que eles têm pouca ou nenhuma ação contra os fungos dismórficos do histoplasma. São medicamentos pensados muito mais para cândidas e aspergillus, problemas que ocorrem frequentemente em ambientes hospitalares”, informou.
Desta forma, o pesquisador vê na estratégia do reposicionamento de fármacos um alento para combater a doença. Isso significa dar um novo uso para o medicamento já existente, diferente daquele pensado inicialmente. “Existem vários exemplos na literatura. O principal deles é o viagra que não foi pensado originalmente para disfunção erétil. O reposicionamento de fármacos é uma estratégia que reduz muito o tempo e o custo para que um medicamento chegue na prateleira da farmácia porque ele já foi estudado anteriormente, é sabida toda a sua toxicidade, funcionou em testes com animais e é seguro para seres humanos porque já está sendo comercializado”, afirmou.
Todas essas questões levaram a equipe do Laboratório de Micologia a procurar novos medicamentos que pudessem ser utilizados no tratamento da histoplasmose. Esse projeto está sendo financiado pelo Programa de Incentivo a Jovens Pesquisadores do INI. “Estamos analisando uma coleção de 720 diferentes medicamentos já aprovados pelo FDA (Food and Drug Administration/EUA) e procurando quais deles possuem uma ação mais eficaz contra o histoplasma. Uma vez descoberto esses compostos, vamos passar por uma etapa de validação, principalmente na literatura científica, antes de prosseguir com os estudos e sugerir um ensaio clínico com essa droga reposicionada”, destacou Rodrigo.
O projeto começou em 2019 e, até o momento, como resultado preliminar, 14 fármacos foram capazes de inibir o crescimento do histoplasma. “Estamos estudando sete deles e fazendo uma série de testes para ver quais concentrações seriam capazes de bloquear diferentes cepas da doença. Tivemos drogas que inibiram em concentrações muito altas, outras foram boas para uma e não tão boas para outra e outras drogas podem ter duplo uso, ou seja, podem ser ministradas para tratar a histoplasmose junto com outras doenças infecciosas”, concluiu o pesquisador.
*Fotos: Paula Gonçalves