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19/01/2024

Estudo do INI/Fiocruz conseguiu reduzir em 30% o número de fumantes num grupo de voluntários 


Alexandre Magno

O Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz) realizou um estudo com 117 voluntários, adultos vivendo com HIV e fumantes ativos que queriam largar o tabagismo, entre dezembro de 2019 e abril de 2022. Ao final, 30% dos participantes conseguiram o resultado almejado. O estudo também avaliou a disfunção endotelial – que é um marcador indireto de doença coronariana. Ao final de 12 semanas de abstinência, houve melhora na dilatação dos vasos sanguíneos, em comparação com quem não conseguiu aderir a abstinência. O que comprova que parar de fumar reduz o risco cardiovascular e melhora as condições de saúde, detectado clinicamente em um curto período de tempo.

O estudo teve como pesquisador principal o médico cardiologista Rodrigo Moreira do Laboratório de Pesquisa Clínica em IST, HIV/Aids (LapClin Aids) do INI. Ele explica que o hábito de fumar tem impacto no tratamento e na progressão de doenças infecciosas, como a aids. “O cigarro é responsável por muitas comorbidades, como a doença pulmonar obstrutiva crônica, as doenças cardiovasculares e o câncer, comorbidades que podem agravar muito o quadro de quem vive com HIV”.

Ele destaca, entretanto, que o estudo mostrou que medidas simples como o aconselhamento breve e o uso de adesivos de nicotina, aliados à mudança de hábitos, podem ser efetivos para quem busca abandonar o tabagismo.

O pesquisador ressalta também que o percentual de pessoas que deixaram de fumar no estudo do INI (30%) é parecido com os dados da literatura e reforçados pelo relatório global sobre o tabagismo divulgado na terça-feira (16/01) pela Organização Mundial de Saúde (OMS). No documento, o Brasil reduziu em 35% o número de fumantes (desde 2010), figurando entre os países que apresentaram as maiores reduções.

O relatório da OMS mostrou que apesar da redução do tabagismo, o número de fumantes ainda é muito alto, chegando a 1,25 bilhões de pessoas em todo o mundo; e que o hábito de fumar é responsável ainda pela morte de 8 milhões de pessoas anualmente. Para acessar o relatório completo da OMS, clique aqui (em Inglês).

Apesar do destaque internacional do Brasil no relatório da OMS, o pesquisador Rodrigo Moreira, ao mencionar o estudo do INI, chama atenção para o fato de que no Brasil, as taxas de tabagismo entre as pessoas que vivem com HIV se mantêm muito acima do percentual da população em geral.

O pesquisador conta que os resultados do estudo serão publicados ainda este ano (2024) no American Journal of Cardiology.

A Assessoria de Comunicação do INI conversou com Rodrigo Moreira. O resultado você confere abaixo.

 

O artigo com os resultados do estudo já foi publicado?

O artigo já foi aceito para ser publicado no American Journal of Cardiology ainda este ano (2024). É importante dizer que o estudo foi possível ser realizado porque recebeu suporte do programa de incentivo Jovem Pesquisador da Fiocruz; e contou também com o apoio da direção do INI -  em especial da diretora Dra. Valdiléa Veloso - que  possibilitou termos o que não pôde ser conseguido pelo incentivo do fundo, como aquisição dos aparelhos para fazer as medições de Monóxido de Carbono; o Ecocardiograma, o software que faz análise da dilatação da artéria braquial e os coordenadores. É preciso também destacar a atuação decisiva da Dra. Beatriz Grinsztejn (chefe de LapClin Aids) para conseguirmos iniciar a pesquisa. 

O que o estudo revelou?

O estudo incluiu 117 adultos que fumavam ativamente e desejavam parar de fumar, no período entre dezembro 2019 e abril de 2022. Nós medimos o pico do monóxido de carbono no ar exalado para confirmar que essas pessoas eram tabagistas e também a cessação do tabagismo nas visitas subsequentes.

Ao final de 12 semanas, com o uso da nicotina transdérmica observou-se que 30% dessa população conseguiu parar de fumar e se manter abstinente. Também avaliamos a disfunção endotelial, que é um marcador indireto de doença coronariana para comparar o grupo que parou de fumar com o grupo que continuou a fumar

Ao final desses três meses, as pessoas que ficaram abstinentes do cigarro mostraram melhora na dilatação do vaso em comparação com o grupo de pessoas que não conseguiram parar de fumar, ou aqueles que pararam por um curto período e voltaram ao hábito. Esse achado mostra a importância da cessação do tabagismo nessa população, já que em um curto período de tempo há uma melhora na saúde do vaso indicando provavelmente que essas pessoas que pararam de fumar estão mais saudáveis e reduziram o risco cardiovascular ao longo prazo.

Que intervenções foram feitas para ajudar os participantes a deixarem o tabaco?

Basicamente usamos os adesivos de nicotina, adquiridos pelo nosso Instituto; e aconselhamento breve. Os participantes eram instruídos a parar de fumar no dia da consulta médica e já saíam com todas as orientações para incentivá-los a parar de fumar, além com números de telefone para contato.

O aconselhamento breve foi dado em todas as consultas em conjunto com o monitoramento por telefone. Cada paciente que tinha dificuldades de parar de fumar ou com o do adesivo, recebia o suporte de coordenadora que ficava em contato direto com esses participantes por meio das mídias sociais e do WhatsApp.  

A aplicação do adesivo de nicotina podia ser de 14 miligramas ou de 24 miligramas, dependendo da carga tabágica. Eles liberam nicotina de forma constante na corrente sanguínea, reduzindo a necessidade de fumar e minimizando os sintomas de abstinência. As pessoas deveriam usar por três meses o adesivo de nicotina e ao final desse período a gente viu que 30% dessa população parou de fumar.

Quais as implicações do fumo para quem possui uma doença infecciosa, como aids?

Sabemos que atualmente com o esquema antirretroviral, as pessoas vivendo com HIV têm uma sobrevida bem parecida com quem não tem o vírus, quando comparamos pela idade. Entretanto, uma das coisas que faz realmente essa população ter mais problemas são as comorbidades. Então, é muito importante incentivar a cessação do tabagismo nesse grupo.

O Brasil tem feito ao longo dos anos muitos esforços para diminuir o tabagismo. Os governos, e, em especial, o Ministério da Saúde, têm implementado e promovido políticas públicas voltadas para o antitabagismo. Com isso, o país tem conseguido reduzir muito o hábito de fumar na população em geral, chegando, ao percentual próximo de 9% em 2023. No entanto, não conseguimos ver essa mesma taxa nas pessoas que vivem com HIV. A nossa coorte mostra que em torno de 30% das pessoas desse grupo ainda fumam, ou seja, o índice três vezes superior ao da população em geral.  Aliás, esse dado foi o motivador para fazer esse estudo.  O percentual de fumantes entre as pessoas vivendo com o vírus é muito preocupante, já que o cigarro é responsável por muitas comorbidades como a doença pulmonar obstrutiva crônica, as doenças cardiovasculares e o câncer, tornando, portanto, o cigarro um fator de risco considerável.

A boa notícia que o estudo mostrou é que com um aconselhamento breve e terapias adjuvantes foi possível promover a cessação do tabagismo. Conseguimos fazer isso durante a consulta médica, ou durante a visita do paciente na instituição, quando pudemos aconselhar esse paciente, prescrever terapias antitabágicas e conseguir uma taxa de sucesso moderada nessa população.

Que tipos de dicas poderiam ser dadas para quem deseja largar o cigarro?

É crucial que o indivíduo queira parar de fumar. A iniciativa tem de vir dele. Os medicamentos e o aconselhamento são medidas de suporte que têm uma eficácia moderada. Então, é importante o paciente ter a noção dos malefícios do seu hábito e a noção do benefício que vai ter parando de fumar; a redução dos riscos de doenças e dos problemas na vida dele, mesmo que ele tenha fumado por um longo período, e uma alta carga tabágica. 

É importante aconselhar e mostrar para essa pessoa que ao parar de fumar, vai melhorar a saúde de uma forma geral. Vai melhorar, por exemplo, a dispneia (falta de ar), o cansaço, muitas vezes a tosse vai diminuir. Há uma melhora geral no estado de saúde em um curto período, com impactos muito positivos na saúde vascular, na redução do risco cardiovascular, no risco de um infarto ou de um AVC.

Então, a pessoa precisa estar bem ciente dos riscos do seu hábito e dos benefícios que vai ter parando de fumar. Depende do esforço e da vontade individual. Outra coisa importante, é saber lidar com a frustração de não conseguir cessar o tabagismo em uma primeira tentativa. Se isso acontecer, deve-se continuar insistindo para aos poucos reduzir a carga tabágica. Muitas vezes é necessário mais de uma tentativa para parar de fumar.

Temos muitos exemplos de participantes que conseguiram parar de fumar trocando o tabagismo por um hábito saudável, como fazer exercício físico regular. Isso tem um ganho na redução da ansiedade. A depressão e a ansiedade muitas vezes estão associadas e impedem ou prejudicam a decisão de parar de fumar. Então tem que tratar essas comorbidades que estão associadas ao tabagismo e que atrapalham muitas vezes.

A pessoa ao manejar de forma mais adequada o estresse da vida ao procurar hábitos saudáveis, como a atividade física regular, a meditação, a saúde mental etc., está contribuindo para impedir aqueles gatilhos que fazem essa pessoa fumar, como a ansiedade, o estresse e a bebida, já que o álcool, está associado ao tabagismo. Por isso, ela precisa evitar o álcool também.

Identificar e evitar os gatilhos vai ajudar muito na decisão de quem quer parar de fumar. No geral, são hábitos de vida saudáveis que ela precisa tentar adquirir.

Por fim, é preciso destacar que o Brasil avançou na cessão do tabagismo com medidas concretas, campanhas educativas, mesmo contra a pressão da indústria.

Outro ponto que destaco é a necessidade urgente de chamar atenção para o cigarro eletrônico. Atualmente existe uma sensação passada para a população de que o cigarro eletrônico não é tão nocivo e pode ser usado para parar de fumar.

Acontece que o cigarro eletrônico funciona basicamente com um reservatório que é aquecido, produzindo vapor d’água e neste líquido são adicionadas diversas substâncias inclusive a nicotina. Então o que as pesquisas cada vez mais apontam é que esse tipo de cigarro é tão nocivo quanto o cigarro comum; e também causa dependência, atingido os mais jovens, não sendo, portanto, uma estratégia razoável ou segura para parar de fumar.

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