INI/Fiocruz encerra participação no 60º Medtrop com debates sobre Chagas, malária, HIV e os desafios da Comunicação
Por Julliana Reis e Alexandre Magno
O Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz) teve uma participação de destaque no 60º Congresso de Medicina Tropical (Medtrop 2025), encerrado em 5 de novembro. O evento, organizado pela Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT) em João Pessoa (PB), foi palco para as pesquisadoras e os pesquisadores do INI apresentarem estudos e debaterem temas cruciais como doença de chagas, malária, leishmanioses, HIV, ISTs e os desafios da comunicação em saúde.
Foco em Chagas, Leishmaniose e Malária
Um dos focos centrais foi a mesa Doença de Chagas e imunossupressão, parte do evento paralelo ChagaLeish 2025. A pesquisadora Fernanda Sardinha destacou a importância de criar uma rede internacional de dados sobre a coinfecção de Chagas com HIV e outros fatores de imunossupressão.
Na mesma sessão, o pesquisador Mauro Mediano apresentou uma proposta para implantar uma plataforma global de vigilância e colaboração para a coinfecção T. cruzi-HIV. “Acreditamos que a implementação dessa plataforma vai melhorar a qualidade dos dados e a pesquisa desenvolvida a partir deles”, explicou Mediano.
História e Futuro das Leishmanioses
Paralelamente, o pesquisador Mauro Marzochi participou da mesa História das leishmanioses no Novo Mundo, ao lado de figuras ilustres como Jaime Benchimol e Jeffrey Shaw. Marzochi fez um alerta importante sobre o rumo das pesquisas: “As pesquisas de campo estão deixando de ser realizadas. Os estudos têm focado somente nos aspectos moleculares. Isso não é suficiente para dar ideia daquilo que ocorre na natureza”.
A malária na região extra-amazônica foi outro tema crítico. A pesquisadora Anielle Pinacosta apresentou dados alarmantes: a letalidade da doença é 51 vezes superior nessas áreas do que em toda região amazônica. Segundo ela, o principal motivo é a falta de suspeição do profissional de saúde, que não realiza o diagnóstico das pessoas que viajam para áreas endêmicas e só vão apresentar sintomas muito tempo depois. “É uma emergência médica e como tal deve ser tratada”, ressaltou, lembrando que “o teste rápido negativo não exclui a malária”.
Em outra sessão, Pinacosta também apresentou os avanços do projeto Abracamal, coordenado pelo INI, que acompanha pacientes para entender a recorrência da infecção. Ela encerrou sua apresentação dizendo que o projeto quer propor um tratamento unificado em áreas fronteiriças.
O Desafio Central: Comunicação em Saúde
Um dos debates mais esperados do congresso foi sobre Comunicação em saúde: desafios da disseminação do conceito de saúde única, mediado pelo pesquisador do INI, André Siqueira.
A infectologista Luana Carvalho, do Hospital Israelita Einstein, comparou a disseminação de fake news à pandemia de Covid-19, configurando uma “pandemia de desinformação”. Ela apontou a dificuldade dos cientistas em usar uma linguagem simples e focada nas necessidades reais da população. “Durante a pandemia, a pergunta que mais chegava para mim – via mídias sociais – era se o cabelo precisava ser lavado sempre que a pessoa fosse à rua”, exemplificou Carvalho. Ela destacou o gap entre a comunicação oficial (focada em máscaras e lavagem das mãos) e as dúvidas do público.
André Siqueira, que também presidiu a Comissão Organizadora do MedTrop 2025, complementou a urgência do tema: “Hoje em dia não basta o pesquisador publicar artigos, conseguir o recurso. Ele tem que saber chegar até as pessoas e conseguir comunicar os seus achados, suas atividades, o processo científico como ele é”.
Pesquisa Clínica e Prevenção de Arboviroses e ISTs
No campo da pesquisa clínica, André Siqueira detalhou a Aliança Dengue, uma cooperação Sul-Sul da qual a Fiocruz faz parte. O objetivo é desenvolver novos tratamentos para a doença, garantindo o protagonismo da região “desde as etapas pré-clínicas até os ensaios clínicos e a posterior comercialização, acesso às pessoas que precisam”.
Em outra frente, Giselle Duarte apresentou os resultados da REPLICK, a Rede de Pesquisa Clínica e Aplicada em Chikungunya, coordenada pelo INI. O estudo acompanhou pacientes por dois anos para avaliar os sintomas e os impactos laborais e na qualidade de vida causados pela infecção.
HIV e ISTs: Combatendo Barreiras
Fechando a participação do Instituto, a mesa Estratégias com PrEP para redução da Incidência de HIV abordou as profundas iniquidades no acesso à prevenção. A pesquisadora Brenda Hoagland palestrou sobre como a questão social e financeira ainda é uma barreira ao tratamento e à profilaxia (PrEP), sobretudo para o público jovem, onde os casos de aids têm crescido. “Uma barreira e uma iniquidade que temos identificado é o determinante financeiro em toda a América Latina. No público onde o HIV mais cresce é onde menos recursos são investidos”, afirmou.
Mayara Secco, última pesquisadora do INI a falar no na programação do Medtrop 2025, apresentou um panorama das ISTs e das perspectivas futuras. Ela destacou estudos para uma vacina para sífilis e o uso da DoxyPEP (doxiciclina como profilaxia pós-exposição), já disponível em outros países. Secco concluiu defendendo uma “abordagem mais positiva e inclusiva” do tema, inclusive nas escolas.
Presença Institucional e Futuro
Além da robusta participação científica, o INI manteve um estande na área de exposições, divulgando seus programas de pós-graduação stricto sensu e lato sensu e promovendo sorteios. Os visitantes foram recebidos e orientados pelo vice-diretor de Ensino do Instituto, Alexandre Vizzoni, e pelas colaboradoras Anne Silva e Juliana Viggiane.
Destacou-se o sorteio de uma inscrição para a Conferência Internacional da Aids (IAS 2026), que ocorrerá pela primeira vez no Brasil, no Rio de Janeiro. O evento global é presidido pela pesquisadora e chefe do LapClin Aids do INI, Beatriz Grinsztejn.
O estande do INI recebeu a visita de mais de 1.300 pessoas durante a realização do Congresso.
O Medtrop 2025, considerado o maior evento do tipo na América Latina, reuniu mais de 3 mil participantes na capital paraibana. A próxima edição será realizada em Brasília (DF).































